O QUE VOCÊ ACHA DO JAZZ?
JAZZ
Harmonia da Escala Maior
Uma grande parte da harmonia do jazz é baseada na
escala maior. Como dissemos antes, cada escala maior tem uma relativa menor que
é formada quando se toca a mesma sequência de notas, mas a partir do sexto grau
da escala maior. Aliás, outras escalas podem ser formadas usando-se a sequência
de notas de uma escala maior, a partir de qualquer um de seus graus. Essas
escalas são chamados modos da escala. A escala maior natural é chamada o modo
jônio (ou jônico ou iônico). A escala formada a partir da sexta nota, a
relativa menor, é chamada de modo eólio. Os nomes desses modos, bem como outros
discutidos abaixo, vêm da Grécia Antiga, embora se diga que esses nomes foram
misturados em traduções muito tempo atrás. Embora os modos gregos tenham
interesse somente histórico na teoria clássica, eles são fundamentais para o
jazz.
Escala Maior ou Modo Jônio
A escala maior, ou modo jônio, deve lhe ser bem
familiar a esta altura. Ela é associada com acordes de sétima maior. No tom de
Dó, por exemplo, o acorde Dó com Sétima Maior, notado Cmaj7 (ou C com um
pequeno triângulo próximo a ele, ou às vezes CM7), tem as notas "Dó, Mi,
Sol, Si", e essas notas delineiam a escala Dó Maior. Se um compasso numa
peça de música é harmonizado com um acorde Cmaj7, a escala Dó Maior é então uma
escala adequada para se usar na improvisação. A única nota dessa escala que soa
ruim quando tocada contra um acorde Cmaj7 é a quarta nota, o Fá. Você pode
convencer a si mesmo disso indo ao piano e tocando o acorde Cmaj7 com a mão
esquerda enquanto toca várias notas da escala Dó Maior com a direita. A quarta
de uma escala maior é geralmente chamada de nota evitada (avoid note)
sobre um acorde de sétima maior. Isso não significa que você não possa nunca
tocar um Fá sobre um Cmaj7, é claro, mas deve estar ciente do efeito dissonante
que isso produz.
O acorde obtido acrescentando-se uma terça no topo
do acorde ("Dó, Mi, Sol, Si, Ré") seria chamada de Cmaj9, e ele
implica a mesma escala. Adicionar uma outra terça resultaria em "Dó, Mi,
Sol, Si, Ré, Fá", e esse acorde seria chamado um Cmaj11. Por causa da
natureza dissonante do Fá nesse contexto, entretanto, nem esse acorde, nem o
acorde Cmaj13, obtido pelo acréscimo de uma terça adicional (Lá), são muito
usados.
Modo Dórico
O modo dórico é construído no segundo grau da
escala maior, usando-se as mesmas notas dessa escala. Por exemplo, a escala
dórica de Ré é montada com as notas da escala Dó Maior, a partir do Ré, e
consiste de "Ré, Mi, Fá, Sol, Lá, Si, Dó". O modo dórico é muito
parecido com uma escala menor, mas o sexto grau é elevado em meio tom. Ou seja,
a escala Ré Menor teria um Si Bemol, enquanto o modo dórico tem um Si. Como ele
parece tanto com a escala menor, é natural tocar esse modo sobre um acorde de
sétima menor. Aliás, ele é usado com mais frequência do que a própria escala
menor. Se você for ao piano e tocar um acorde Dm7 ("Ré, Fá, Lá, Dó")
com a mão esquerda, e tocar as notas do modo dórico de Ré e da escala menor de
Ré na mão direita, vai provavelmente concluir que o modo dórico soa melhor,
porque o Si é menos dissonante contra um acorde Dm7 do que o Si Bemol. Se você
usar o modo dórico sobre um acorde de sétima menor, não há notas evitadas.
Do mesmo modo que com o acorde de sétima maior,
você pode acrescentar terças ao acorde de sétima menor para fazer Dm9, Dm11 e
Dm13. Esses acordes ainda implicam o uso da mesmo modo dórico. Se você usar a
escala menor natural, o acorde de décima terceira contém a nota Si Bemol, que é
um tanto dissonante nesse contexto. Esse acorde é raramente usado, mas quando ele
é pedido, é geralmente notado Dm7b6, e é uma das poucas exceções à regra de que
a maioria dos acordes são grafados em termos das extensões com números ímpares
acima da sétima. Essa regra vem do fato de que os acordes são tradicionalmente
feitos pela sobreposição de terças. A notação Dm6 é às vezes um sinônimo de
Dm13 quando o Si natural é explicitamente pedido.
Modo Frígio
O terceiro modo da escala maior é chamado de modo
frígio. Na tonalidade de Dó, uma escala frígia é construída sobre o Mi, e
consiste de "Mi, Fá, Sol, Lá, Si, Dó, Ré". Essa escala, como o modo
dórico, também é similar à escala menor, exceto que o segundo grau no modo
frígio é rebaixado em meio tom. Ou seja, uma escala Mi Menor teria um Fá
Sustenido, enquanto o modo frígio tem um Fá. Se você tentar tocar a escala
frígia sobre um acorde de sétima menor, vai provavelmente achá-lo mais
dissonante do que a escala menor, por causa da segunda rebaixada. O modo frígio
é usado ocasionalmente sobre um acorde de sétima menor, embora geralmente o acorde
seja notado como m7b9 como uma dica ao improvisador de que o modo frígio deve
ser usado. Há outras situações específicas em que a escala frígia soa bem. Uma
delas é sobre um acorde de sétima da dominante com uma quarta suspensa (veja
modo mixolídio, abaixo) e uma nona rebaixada, notada susb9. Outra é sobre um
acorde específico que eu vou simplesmente chamar de um acorde frígio. Um acorde
frígio sobre Mi seria "Mi, Fá, Lá, Si, Ré". Quando o modo frígio é
tocado sobre esse tipo de acorde, o resultado é um som um tanto espanhol,
particularmente se você acrescentar um Sol Sustenido à escala, resultando
naquilo que é às vezes chamado de escala frígia espanhola. Várias músicas de
Chick Corea, entre elas "La Fiesta", e boa parte da música do disco Sketches
Of Spain, de Miles Davis, usam essa sonoridade extensivamente.
Modo Lídio
O quarto modo da escala maior é o modo lídio. Na
tonalidade de Dó, uma escala lídia é construída sobre o Fá, e consiste de
"Fá, Sol, Lá, Si, Dó, Ré, Mi". Essa escala é como a escala maior,
exceto que ela contém um quarto grau aumentado. Ou seja, uma escala de Fá Maior
conteria um Si Bemol, enquanto a escala lídia contém um Si natural. Como o
quarto grau da escala maior é uma nota evitada sobre um acorde de sétima maior,
essa escala dá ao improvisador uma alternativa. Embora o som da quarta elevada
possa soar um pouco incomum no começo, você vai ver que ela é em geral
preferível à quarta natural da escala maior. Quando o símbolo Cmaj7 aparece,
você tem a escolha entre as escalas maior e lídia. Geralmente, se o modo lídio
é especificamente desejado, vai aparecer o símbolo Cmaj7#11. Lembre-se que um
acorde Cmaj11 contém um Fá como a décima primeira; o Cmaj7#11 denota que essa
nota deve ser elevada em meio tom.
Modo Mixolídio
O quinto modo da escala maior é o modo mixolídio.
Na tonalidade de Dó, uma escala mixolídia é construída sobre o Sol, e consiste
das notas "Sol, Lá, Si, Dó, Ré, Mi, Fá". Essa escala é como a escala
maior, exceto que o sétimo grau é rebaixado em meio tom. Ou seja, uma escala
maior de Sol conteria um Fá Sustenido enquanto a mixolídia contém um Fá. Como o
acorde de sétima construído sobre o quinto grau da escala maior é uma sétima da
dominante, é natural que se toquem linhas baseadas no modo mixolídio sobre um
acorde de sétima da dominante. Por exemplo, a escala mixolídia de Sol pode ser
usada sobre um acorde G7.
Do mesmo modo que com a escala maior sobre um
acorde de sétima maior, o quarto grau da escala (Dó no caso do Sol Mixolídio) é
uma nota um tanto evitada sobre um acorde de sétima da dominante. Entretanto,
existe um acorde chamado de acorde suspenso, notado Gsus, Gsus4, G7sus, G7sus4,
F/G, Dm7/G, ou G11 sobre o qual não há notas a evitar no modo mixolídio de Sol.
A notação F/G indica uma tríade de Fá Maior sobre a nota Sol no baixo. O termo
"suspensão" vem da harmonia clássica e se refere ao retardo
temporário da terça num acorde da dominante ao se tocar primeiro a quarta,
antes de resolvê-la na terça. No jazz, entretanto, a quarta geralmente não é
nunca resolvida. O acorde suspenso consiste da fundamental, quarta, quinta, e
geralmente também a sétima. A música "Maiden Voyage", de Herbie
Hancock, consiste somente de acordes suspensos não resolvidos.
Escala Menor ou Modo Eólio
O modo eólio, ou escala menor, já foi discutido.
Ele pode ser tocado sobre um acorde menor com sétima, embora os modos dórico ou
frígio sejam usados com mais frequência. Ele é geralmente mais usado sobre um
acorde m7b6.
Modo Lócrio
O sétimo e último modo da escala maior é o modo
lócrio. Na tonalidade de Dó, uma escala lócria é construída sobre o Si, e
consiste das notas "Si, Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá". O acorde de sétima
construído sobre essa escala ("Si, Ré, Fá, Lá") é um acorde de sétima
meio diminuto, Bm7b5. Esse símbolo vem do fato de que esse acorde é similar a
um Bm7, exceto que a quinta é rebaixada em meio tom. O símbolo clássico para
esse acorde é um círculo cortado por um "/" no meio. A escala lócria
pode ser usada sobre um acorde de sétima meio diminuto (também chamado de
sétima menor com quinta bemol), mas o segundo grau é um tanto dissonante e é às
vezes considerado uma nota evitada.
Harmonia da Escala Menor
Melódica
Na teoria clássica, há três tipos de escala menor.
A escala menor que já discutimos, o modo eólio, é também chamada de escala
menor natural ou pura. As duas outras escalas menores foram derivadas dela para
oferecer possibilidades harmônicas e melódicas mais interessantes. Se você
construir uma progressão ii-V-I numa escala menor, vai descobrir que o acorde
de sétima construído sobre a tônica é um acorde de sétima menor, e o acorde de
sétima construído sobre o segundo grau é um acorde de sétima meio diminuto. Por
exemplo, Am7 e Bm7b5 na escala Lá Menor. O acorde construído sobre o quinto
grau dessa escala é um acorde menor, por exemplo Em7 em Lá Menor. A resolução
de Em7 em Am7 não é tão forte quanto a de E7 em Am7. Além disso, o Am7 não soa
como uma tônica; ele soa como se precisasse resolver num acorde de Ré Maior. Ao
elevar o sétimo grau da escala menor em meio tom (isto é, elevar o Sol de Lá
Menor para Sol Sustenido), esses problemas são resolvidos. O acorde construído
no quinto grau é agora um E7, e o acorde de sétima construído sobre a tônica é
uma tríade de Lá Menor com uma sétima maior, geralmente notado Am-maj7. Isso
cria um ii-V-i muito mais forte. A escala resultante, "Lá, Si, Dó, Ré, Mi,
Fá, Sol Sustenido", é chamada de menor harmônica, porque se entende que
ela gera harmonias mais interessantes que a escala menor natural.
O sétimo grau de uma escala maior é às vezes
chamado de nota sensível, já que está somente meio tom abaixo da tônica e
encaminha muito bem a ela melodicamente. O sétimo grau da escala menor natural,
por sua vez, está um grau inteiro abaixo da tônica e não encaminha tão bem para
ela. Embora a escala menor harmônica contenha uma nota sensível, se você tocar
essa escala, notará que o intervalo entre o sexto e o sétimo graus (o Fá e o Sol
Sustenido na escala Lá Menor Harmônica) é estranho melodicamente. Esse
intervalo é chamado de segunda aumentada. Embora ele soe exatamente como uma
terça menor, não há tons na escala entre as duas notas. Esse intervalo é
considerado dissonante na harmonia clássica. Para consertar a situação, a sexta
pode ser elevada meio tom também (de Fá para Fá Sustenido) para gerar a menor
melódica. Na teoria clássica, essa escala é geralmente usada somente de modo
ascendente. Quando descendente, já que o Sol Sustenido não é usado para
encaminhar para a tônica Lá, a menor natural é geralmente usada em seu lugar. A
harmonia de jazz normalmente não distingue esses casos, contudo. A escala menor
melódica ("Lá, Si, Dó, Ré, Mi, Fá Sustenido, Sol Sustenido") é usada
tanto no sentido ascendente quanto no descendente.
Tanto a menor harmônica quanto a melódica delineiam
um acorde m-maj7 no primeiro grau, por exemplo um Am-maj7 ("Lá, Dó, Mi,
Sol Sustenido") em Lá Menor. Tanto a escala menor harmônica quanto a menor
melódica podem ser usadas sobre este acorde. A menor melódica também é usada
sobre acordes marcados simplesmente m6, embora, como foi observado antes, esse
símbolo possa também implicar o modo dórico. Vários dos modos da escala menor
melódica geram harmonias particularmente interessantes e são tocados com
frequência no jazz. Essas escalas não são normalmente descritas na teoria
clássica, por isso os nomes delas são menos padronizados que os modos da escala
maior.
Frígio com Sexta Maior
Não existe um termo único para o segundo modo da
escala menor melódica. O segundo modo da menor melódica de Lá é "Si, Dó,
Ré, Mi, Fá Sustenido, Sol Sustenido, Lá". Esta escala é similar ao modo
frígio, exceto que tem uma sexta maior. Por esse motivo, ela pode ser chamada
de modo frígio com sexta maior, embora esse nome não seja de modo algum
padronizado. Ele é usado com mais frequência como um substituto para o modo
frígio.
Lídio Aumentado
O terceiro modo da escala menor melódica é
conhecido como um modo lídio aumentado. Numa menor melódica de Lá, uma escala
lídia aumentada é construída sobre o Dó e consiste de "Dó, Ré, Mi, Fá
Sustenido, Sol Sustenido, Lá, Si". Essa escala contém um acorde aumentado
com sétima maior, "Dó, Mi, Sol Sustenido, Si". Não existe um símbolo
padrão para este acorde, mas se utiliza Cmaj7#5 ocasionalmente, como também
Cmaj7-aug ou Cmaj7+. Quando esse acorde é pedido, a escala lídia aumentada é
uma escolha apropriada. O acorde maj7#5 é usado principalmente como um
substituto para um acorde normal de sétima maior.
Lídio Dominante
O quarto modo da escala menor melódica é geralmente
chamado de lídio dominante, ou lídio com sétima bemol (lídio b7). Se você
montá-lo, verá por quê. Numa escala menor melódica em Lá, uma escala lídia
dominante é feita a partir do Ré e consiste de "Ré, Mi, Fá Sustenido, Sol
Sustenido, Lá, Si, Dó". Esta escala lembra a escala Ré Maior, "Ré,
Mi, Fá Sustenido, Sol, Lá, Si, Dó Sustenido", mas com duas alterações: a
quarta aumentada, característica do modo lídio, e a sétima menor,
característica do modo mixolídio. O modo mixolídio foi descrito como uma
possível escolha de escala para uso sobre um acorde de sétima da dominante, mas
o quarto grau era uma nota a se evitar. A escala lídia dominante não contém
esta nota a evitar. Do mesmo modo que com a escala lídia e a quarta aumentada
sobre um acorde de sétima maior, a escala lídia dominante pode soar incomum a
princípio, mas é geralmente mais interessante do que o modo mixolídio quando
tocada sobre uma sétima da dominante.
Este som específico, a quarta aumentada sobre um
acorde de sétima da dominante, era muito usado na era do bebop, e fez os
primeiros músicos do bebop receber muitas críticas pelo uso desses sons não
tradicionais. Esse som foi também a gênesis da composição "Raise
Four", de Thelonious Monk, que apresenta com destaque a quarta aumentada
na melodia. O uso dessa escala é geralmente indicado explicitamente pelo
símbolo D7#11. Músicos do bebop geralmente chamavam essa nota de uma quinta
bemol, grafando o símbolo do acorde como D7b5, embora isso normalmente implique
a escala diminuta, que é discutida mais adiante.
Quinto Modo
O quinto modo da escala menor melódica não tem um
nome estabelecido, e normalmente só é usado sobre um acorde do V grau numa
progressão ii-V-i de uma tonalidade menor. Esse uso será discutido mais
adiante.
Lócrio com Segunda Maior
O sexto modo da escala menor melódica é geralmente
chamado de lócrio com segunda maior, já que é na verdade o modo lócrio com um
II grau elevado em meio tom. Por exemplo, o modo lócrio de Fá Sustenido é
baseado em Sol Maior e consiste de "Fá Sustenido, Sol, Lá, Si, Dó, Ré,
Mi", mas a escala lócria com segunda maior de Fá Sustenido é baseada num
Lá Menor Melódico e consiste de "Fá Sustenido, Sol Sustenido, Lá, Si, Dó,
Ré, Mi". Já que o segundo grau do modo lócrio é uma nota evitada sobre um
acorde m7b5, a escala lócria com segunda maior é geralmente usada em seu lugar.
Essa escala é também chamada às vezes de escala meio diminuta.
Escala Alterada
O sétimo modo da escala menor melódica é geralmente
chamado de escala diminuta de tons inteiros, porque ele combina os elementos
das escalas diminuta e de tons inteiros, que são discutidas mais adiante. Outro
nome para essa escala é escala alterada. Para ver por quê, recorde-se da
discussão introdutória sobre acordes. Os acordes são construídos pela
superposição de terças. Discutimos as tríades, que contêm três notas, bem como
os acordes de sétima, que contêm quatro notas. No tom de Dó, o acorde G7 é o acorde
de sétima da dominante. Ele contém uma fundamental (Sol), uma terça (Si), uma
quinta (Ré), e uma sétima (Fá). Se adicionarmos outra terça no topo, Lá, temos
um acorde de nona, o G9. Se acrescentarmos uma outra terça, Dó, temos um acorde
de décima primeira, G11. O Dó é o quarto grau dessa escala, e é normalmente uma
nota evitada. Este símbolo é normalmente usado somente quando a quarta é
explicitamente exigida, como num acorde suspenso. Se então adicionarmos uma
outra terça, Mi, temos um acorde de décima terceira, G13. O Dó é normalmente
omitido desse acorde. Uma outra terça nos retornaria ao Sol.
Esse acorde pode ser alterado pela elevação ou
rebaixamento de notas individuais em meio tom. A fundamental, terça, e sétima
não são normalmente alteradas, já que são as notas que mais definem um acorde.
Uma mudança em qualquer uma dessas destrói a sensação de dominante do acorde. A
décima primeira elevada já foi discutida. As outras alterações interessantes
são a quinta e a nona. Para um acorde G7, isso significa uma quinta rebaixada,
ou bemol (Ré Bemol), a quinta elevada, ou sustenida (Ré Sustenido), a nona
rebaixada, ou bemol (Lá Bemol), e a nona elevada, ou sustenida (Lá Sustenido).
Agora, vamos retornar à chamada escala alterada.
Uma escala alterada de Sol pode ser construída a partir da escala Lá Bemol
Melódica, e consiste de "Sol, Lá Bemol, Si Bemol/Lá Sustenido, Dó
Bemol/Si, Ré Bemol, Mi Bemol/Ré Sustenido, Fá". Em primeiro lugar, observe
que essa escala contém Sol, Si, e Fá, a fundamental, terça e sétima do acorde
G7. As notas restantes, Lá Bemol, Si Bemol, Ré Bemol e Mi Bemol, são
respectivamente a nona bemol, a nona sustenida, a quinta bemol e a quinta
sustenida. Em outras palavras, todas as possíveis alterações num acorde de nona
estão incluídas nessa escala. O acorde implícito nessa escala é em geral notado
simplesmente como G7alt, embora a notação G7#9#5 também seja usada, como também
a G7#9. Os símbolos b9 e b5 não são normalmente usados nesse contexto, a
despeito de estarem presentes na escala, por que eles implicam a escala
diminuta, que é discutida mais adiante.
O som da escala alterada e o acorde que ela implica
são muito mais complexos do que qualquer outra escala/acorde de sétima da
dominante apresentado até aqui, e é um dos sons mais importantes do jazz
pós-bop. Talvez seja bom você investir mais tempo nessa escala para se
acostumar a ela. Tente ir ao piano e tocar a fundamental, terça, e sétima com a
mão esquerda, enquanto toca a escala alterada, e linhas melódicas baseadas
nela, com a direita. Você pode utilizar essa escala mesmo quando o acorde
pareça ser um acorde de sétima da dominante comum, mas deve fazê-lo com cautela
num ambiente de grupo, porque outros integrantes da banda podem estar tocando
sons do modo mixolídio ou lídio dominante, e sua escala alterada vai soar
dissonante em relação a eles. Isso não é necessariamente errado, mas você deve
estar consciente do efeito produzido.
Escalas Simétricas
Quando um modo de uma dada escala produz o mesmo
tipo de escala que a original, essa escala é dita simétrica. Várias escalas
importantes usadas por músicos de jazz são simétricas. Por exemplo, a escala
cromática é simétrica, já que cada modo individual dela é uma outra escala
cromática. Nesse caso, há na verdade somente uma escala cromática única; todas
as outras são somente modos dela. Em geral, se N modos de uma dada escala
produzem o mesmo tipo de escala (inclusive o primeiro modo, a própria escala
original), então há somente 12/N escalas diferentes desse tipo.
Uma coisa a se observar nas escalas discutidas
nesta seção é que elas parecem se prestar a tocar padrões melódicos, e às vezes
é difícil conseguir não soar cliché quando se usa essas escalas. Quando se tem
vários compassos de um dado acorde, uma técnica comum é tocar uma figura breve
na escala a ele associada e repeti-la transposta a várias posições diferentes.
Por exemplo, um possível padrão em Dó Maior seria "Dó, Ré, Mi, Sol".
Esse padrão pode ser repetido várias vezes com o início em diferentes posições,
talvez como "Ré, Mi, Fá, Lá" ou "Mi, Fá, Sol, Si". Por
alguma razão, muitas das escalas apresentadas abaixo convidam a esse tipo de
abordagem, e é fácil terminar com uns poucos clichés que você acaba usando
todas as vezes que é confrontado por essas escalas. Sempre fique atento a isso.
Você não deve se sentir como se uma escala estivesse ditando o que você pode ou
deve tocar.
Escala de Tons Inteiros
Uma escala particularmente fácil é a escala de tons
inteiros, assim chamada porque todos os graus da escala são intervalos de um
tom. Uma escala de tons inteiros em Dó consiste de "Dó, Ré, Mi, Fá
Sustenido, Sol Sustenido, Si Bemol". Ela tem somente seis notas, e todos
os seus modos (inclusive o modo original) formam escalas de tons inteiros. Há
assim somente 12/6 ou 2 escalas de tons inteiros. A outra é "Ré Bemol, Mi
Bemol, Fá, Sol, Lá, Si".
Como o primeiro, o terceiro e o quinto graus dessa
escala formam uma tríade aumentada, essa escala pode ser tocada sobre acordes
aumentados. Essa escala também contém a nota que seria a sétima num acorde de
sétima da dominante (ou seja, Si Bemol num acorde C7). O acorde implícito nessa
escala é notado como C7aug, Caug, C7+, C+, ou C7#5.
Escalas Diminutas
Uma outra escala simétrica é a escala diminuta.
Essa escala é também chamada de escala tom-semitom, ou escala semitom-tom,
porque ela é construída pela alternação de intervalos de tons e semitons. Uma
escala tom-semitom (vamos abreviá-la TS) em Dó consiste de "Dó, Ré, Ré
Sustenido, Fá, Fá Sustenido, Sol Sustenido, Lá, Si"; uma escala
semitom-tom (abreviada ST) consiste de "Dó, Ré Bemol, Mi Bemol, Mi, Fá
Sustenido, Sol, Lá, Si Bemol". Essas escalas contêm oito notas cada.
Observe que, além da escala original, os modos que se iniciam na terça, quinta,
e sétima seja de uma escala TS ou de uma ST (além do primeiro modo) formam
outra escala TS ou ST, por isso há somente 12/4 ou 3 escalas diminutas
diferentes de cada tipo. Além disso, observe que a escala diminuta TS é
exatamente o segundo modo da escala diminuta ST, por isso, na verdade, há
somente três escalas diminutas distintas no total. As versões TS e ST dessa
escala são, entretanto, usadas em situações diferentes.
A escala diminuta ST delineia um acorde de sétima
da dominante com uma nona e quinta bemol. Por exemplo, C7b9b5 é "Dó, Mi,
Sol Bemol, Si Bemol, Ré Bemol", e essas notas, bem como a sexta, a quinta
natural e a nona elevada, estão todas presentes na escala diminuta ST de Dó. A
escala ST é por isso uma boa escolha para se usar sobre acordes de sétima da
dominante b9b5. John Coltrane usou muito essa sonoridade.
Essa escala é muito similar à escala alterada,
que, se você recorda, também é chamada de escala diminuta de tons inteiros. A
escala alterada em Dó contém as primeiro cinco notas da escala diminuta ST de
Dó e as quatro últimas (superpondo o Mi e o Fá Sustenido) da escala de tons
inteiros de Dó. Já que ambas as escalas contêm quintas rebaixadas e nonas
rebaixadas e elevadas, elas são às vezes usadas indistintamente sobre acordes
de sétima da dominante. Tente ir para o piano e praticar essas duas escalas com
sua mão direita, sobre a fundamental, terça e sétima na esquerda. Elas soam
muito similares. Muitos fakebooks são inconsistentes no uso dos símbolos alt,
#9, b9, b5, #9#5, e b9b5. A lição aqui é que você vai ter que contar com seus
ouvidos e com o bom senso para se guiar no uso dessas duas escalas.
A escala diminuta TS delineia um acorde de sétima
diminuta e é por isso usado sobre acordes diminutos. Por exemplo, a escala
diminuta TS de Dó (Dó, Ré, Ré Sustenido, Fá, Fá Sustenido, Sol Sustenido, Lá,
Si) pode ser tocada sobre Cdim ou Cdim7. O símbolo clássico para acordes
diminutos, um pequeno círculo, também é usado às vezes. Observe que essa escala
é a mesma que as escalas diminutas TS de Ré Sustenido, Fá Sustenido, e Lá, e na
verdade Cdim7, D#dim7, F#dim7, e Adim7 são todas inversões do mesmo acorde.
Eles podem ser usados indistintamente.
Mais importante ainda é que essa escala é também o
mesmo que as escalas diminutas ST em Ré, Fá, Sol Sustenido, e Si. Essas escalas
são associadas com seus respectivos acordes dominantes com nona bemol e quinta
bemol (b9b5). Os acordes diminutos Dó, Mi Bemol, Fá Sustenido e Lá são por isso
geralmente usados como substituições de acordes para os respectivos acordes de
sétima da dominante, e vice-versa. Na maioria dos lugares onde você vê um
acorde diminuto, pode substituí-lo por um dos respectivos acordes de sétima da
dominante. Uma progressão particularmente comum é | Cmaj7 | C#dim | Dm7 |. O
acorde C#dim aqui implica a escala diminuta TS de Dó Sustenido, que é o mesmo
que as escalas diminutas ST de Dó, Mi Bemol, Fá Sustenido, e Lá. Nesse caso, o
acorde A7b9b5 pode ser usado no lugar do acorde C#dim. Não apenas os acordes
A7b9b5 e C#dim compartilham a mesma escala, mas o acorde de Lá com Sétima da
Dominante também resolve bem no acorde de Ré Menor. Quaisquer escalas
associadas com acordes de Lá com Sétima da Dominante, como o Lá Mixolídio, Lá
Lídio Dominante, Lá Alterado, ou Lá Blues, podem ser assim tocadas sobre um
acorde C#dim nesse contexto.
Escalas Pentatônicas
Há um grupo de escalas de cinco notas conhecidas
coletivamente como escalas pentatônicas. Os intervalos numa escala pentatônica
tradicional são normalmente limitados a tons inteiros e terças menores. Muitos
músicos usam essas escalas relativamente simples com bom resultado, entre eles
McCoy Tyner e Woody Shaw. As duas escalas pentatônicas básicas são a escala
pentatônica maior e a escala pentatônica menor. Uma escala pentatônica maior em
Dó contém "Dó, Ré, Mi, Sol, Lá", e uma escala pentatônica menor em Dó
contém "Dó, Mi Bemol, Fá, Sol, Si Bemol". Observe que a escala
pentatônica menor em Dó é na verdade o quinto modo de uma escala pentatônica
maior em Mi Bemol. Outros modos das escalas pentatônicas também são usados,
como por exemplo "Dó, Ré, Fá, Sol, Si Bemol", que é o segundo modo da
escala pentatônica maior em Si Bemol. Essa escala pode ser chamada de escala
pentatônica suspensa, embora essa terminologia não seja de modo algum
universal.
Como seus nomes implicam, as escalas pentatônicas
maior, menor e suspensa podem ser usadas sobre acordes maiores, menores e
suspensos respectivamente. Por exemplo, a escala pentatônica maior em Dó pode
ser usada sobre Cmaj7. Esse acorde é às vezes grafado C6 para deixar mais
enfatizado que a escala pentatônica maior deve ser usada. A escala pentatônica
menor em Dó pode ser usada sobre Cm7. A escala pentatônica suspensa em Dó pode
ser usada sobre um acorde C7sus.
Outras escalas de cinco notas também são usadas
ocasionalmente. Por exemplo, a escala "Mi, Fá, Lá, Si, Ré" é a
tradicional "escala in sen" japonesa. Ela pode ser usada como uma
substituta para o modo frígio em Mi (observe que ela de fato define o acorde Mi
Frígio) para acrescer um sabor oriental à música. Entre as variações úteis
dessa escala estão o segundo modo, "Fá, Lá, Si, Ré, Mi", que pode ser
usado sobre um acorde Fmaj7#11; o quarto modo, "Si, Ré, Mi, Fá, Lá",
que pode ser usado sobre um acorde Bm7b5; e o quinto modo, "Ré, Mi, Fá,
Lá, Si", que pode ser usado sobre um acorde Dm6.
Como há relativamente poucas notas numa escala
pentatônica, uma única escala pentatônica pode geralmente ser usada sobre
vários diferentes acordes sem nenhuma nota a se evitar realmente. Por exemplo,
a escala pentatônica maior em Dó, "Dó, Ré, Mi, Sol, Lá", pode ser
usada sobre Cmaj7, C7, D7sus, Dm7, Em7b6, Fmaj7, G7sus, Gm7, ou Am7.
A Escala de Blues
e Outras Escalas Derivadas
e Outras Escalas Derivadas
As escalas nesta seção são principalmente derivadas
de progressões de acordes, em vez de acordes específicos. Na maioria das vezes,
elas podem ser usadas como pontes entre acordes, o que permite que você toque a
mesma escala, ou escalas muito aproximadas, sobre dois ou mais acordes
diferentes. Isso é às vezes chamado de generalização harmônica.
A Escala de Blues
A escala de blues é geralmente a primeira escala,
depois da escala maior, ensinada a iniciantes na improvisação, e em muitos
casos é a única outra escala que aprendem. Essa escala supostamente tem suas
raízes na música afro-americana com surgimento na época da escravidão, mas as
origens exatas de sua encarnação moderna são desconhecidas. A escala de blues
em Dó consiste de "Dó, Mi Bemol, Fá, Fá Sustenido, Sol, Si Bemol". O
segundo grau dessa escala, que é a terça bemol da escala menor, é chamada de
"blue note". Na música vocal, ela é geralmente cantada em
alguma parte entre um Mi Bemol e um Mi. Na música instrumental, várias técnicas
são empregadas para se alcançar o mesmo efeito, tais como esticar a corda
enquanto se toca um Mi Bemol em instrumentos de corda, tocar mais baixo um Mi
num instrumento de sopro, ou tocar Mi Bemol e Mi simultaneamente num
instrumento de teclado. A sétima e a quinta bemóis também são às vezes chamadas
de blue notes, e nem sempre são cantadas ou tocadas exatamente na altura grafada.
Variações da escala de blues que incluem uma terça, quinta ou sétima naturais
também podem ser usadas. Além disso, observe que se uma quinta bemol for
omitida, a escala resultante é a escala pentatônica menor. A escala pentatônica
menor pode por isso ser usada como substituta da escala de blues, e vice-versa.
A beleza da escala de blues é que ela pode ser
tocada sobre toda uma progressão de blues sem nenhuma nota evitada. Se você
tentar linhas melódicas baseadas nessa maneira de tocar, por exemplo, uma escala
de blues em Dó sobre um acorde C7, você recebe um retorno positivo instantâneo,
já que quase tudo que você consegue fazer soa bem. Isso infelizmente leva
muitos músicos a usar demais essa escala, e a esgotar suas ideias rapidamente.
Há somente um número limitado de fraseados que podem ser tocados numa escala de
seis notas, e a maioria deles já foi tocada milhares de vezes a esta altura.
Isso não significa dizer que você não deva nunca usar a escala de blues; pelo
contrário, ela é vitalmente importante para o jazz. Mas não vá ficar tão
encantado com a gratificação fácil produzida por ela a ponto de praticar
fraseados de blues exaustivamente, em vez de expandir seu vocabulário
harmônico.
A metáfora da língua é uma boa. É difícil dizer
coisas interessantes com um vocabulário limitado. Geralmente músicos como Count
Basie são dados como exemplos de músicos que tiram muito de muito pouco, mas há
uma diferença entre dizer poucas palavras porque você está escolhendo elas
cuidadosamente, e dizer poucas palavras porque você não tem nada a dizer ou
porque seu vocabulário é muito limitado para exprimir suas ideias. Esse
conselho transcende a escala de blues, é claro.
Não é sempre necessário variar o conteúdo harmônico
de sua música se você for suficientemente criativo em outros aspectos. Uma
maneira de criar um interesse maior quando estiver usando a escala de blues é
usar qualquer efeito especial à sua disposição para variar seu som. Eles podem
incluir honking (tocar uma mesma nota repetidas vezes) e screaming (tocar
notas nos registros mais altos) para saxofonistas, growling para
baixistas, ou o uso de clustersno piano.
Escalas Menores
A escala menor harmônica é às vezes tocada sobre
acordes m-maj7. Seus modos não têm nomes padronizados, e são raramente usados
por músicos de jazz, exceto como pontes sobre uma progressão harmônica ii-V-i.
Por exemplo, considere a progressão | Bm7b5 | E7alt | Am-maj7 |. Uma escala
menor harmônica de Lá pode ser tocada sobre todos os três acordes, em vez do
tradicional uso das escalas Si Lócria, Mi Alterada e Lá Menor Melódica. Outra
maneira de dizer isso é que o segundo modo pode ser tocado sobre um acorde
m7b5, e que o quinto modo pode ser usado sobre um acorde alterado da dominante.
Mesmo quando você não está usando a escala menor harmônica sobre uma progressão
inteira, talvez seja uma boa usar o seu quinto modo sobre um acorde de V numa
progressão ii-V-i em tonalidade menor. A vantagem de usar essa escala nesse
exemplo é que ela difere das escalas Si Lócria e Lá Menor Melódica por somente
uma nota cada. A desvantagem é que a tônica da escala é uma nota evitada nesse
contexto.
A escala menor melódica pode ser usada da mesma
maneira; seu quinto modo pode ser usado sobre o acorde V numa progressão ii-V-i
para manter algum ponto em comum entre as escalas usadas. Observe entretanto
que o segundo modo da escala Lá Menor Melódica não é uma escolha ideal sobre o
acorde Bm7b5, porque essa escala tem Fá Sustenido em vez de Fá. Essa é a única
diferença entre as escalas menores harmônica e melódica. A escolha em relação a
se se deve usar o quinto modo das escalas menores harmônica ou melódica sobre
um acorde de sétima da dominante pode parcialmente depender da tonalidade da
música. Se Fá Sustenido estiver na armadura de tom, então a escala menor melódica
pode soar mais diatônica. Você pode optar por essa escala se esse for o som que
estiver tentando obter, ou pela menor harmônica se estiver tentando evitar soar
diatônico. Por outro lado, se o Fá Sustenido não estiver na armadura de tom,
então a escala menor harmônica pode soar mais diatônica. Uma outra questão a
considerar é qual dessas escalas está mais perto da escala que você está usando
no acordes anterior e no posterior. Dependendo do som que você estiver tentando
conseguir, pode escolher a escala que tenha mais ou menos notas em comum com as
escalas adjacentes.
Escalas Bebop
A escala bebop maior é uma escala maior acrescida
de uma quinta aumentada ou sexta menor. A escala bebop maior de Dó contém
"Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Sol Sustenido, Lá, Si". Essa escala pode ser
usada sobre acordes de sétima maior ou acordes aumentados de sétima maior. A
escala bebop maior de Dó pode também ser usada como uma ponte entre acordes
numa progressão como | Cmaj7 | Bm7b5 E7 | Am |; ou seja, a mesma escala pode
ser tocada sobre toda a progressão. Uma outra maneira de ver isso é dizer que
estamos tocando a escala bebop maior de Dó sobre o acorde Cmaj7, tocando seu
oitavo modo sobre o acorde Bm7b5, tocando seu terceiro modo sobre o acorde E7,
e tocando seu sétimo modo sobre o acorde Am. Esses modos lembram de perto as
escalas maior, lócria, alterada e menor, respectivamente. Observe que estamos
usando uma escala bebop maior de Dó sobre uma progressão ii-V-i em Lá Menor. Em
geral, podemos usar a escala bebop maior em qualquer tonalidade específica
sobre uma progressão ii-V-i na relativa menor daquela tonalidade.
Entre as outras escalas bebop está a escala bebop
da dominante, que é similar ao modo mixolídio, mas com uma sétima maior
adicional. A escala bebop dominante de Dó é portanto formada por "Dó, Ré,
Mi, Fá, Sol, Lá, Si Bemol, Si". Essa escala pode ser usada sobre acordes
de sétima da dominante. A sétima maior não é na verdade uma nota evitada se
você a usar como um tom de passagem entre o Dó e o Si Bemol. Ela também serve
como a quarta elevada do acorde Fmaj7 que provavelmente seguirá o acorde C7. Há
também uma escala bebop menor, que é uma escala dórica com uma terça elevada
adicional. A escala bebop menor de Dó é portanto "Dó, Ré, Mi Bemol, Mi,
Fá, Sol, Lá, Si Bemol". Essa escala pode ser usada sobre acordes de sétima
menor, e é geralmente usada em progressões de blues de tonalidades menores para
dar um sabor mais de sétima da dominante aos acordes.
Escalas Sintéticas
As escalas de blues e bebop são às vezes chamadas
escalas sintéticas, porque elas não se encaixam bem na teoria clássica e
parecem ter sido inventadas para se adequar a uma situação particular. Em
geral, um número ilimitado de escalas sintéticas pode ser construído usando-se
intervalos de segunda menor, maior ou aumentada. Talvez seja bom que você
experimente criar suas próprias escalas e procure oportunidades para usá-las.
Quadro de Acordes e Escalas
A tabela abaixo lista os acordes que ocorrem com
mais frequência na harmonia de jazz junto com as escalas normalmente associadas
a cada acorde. Os acordes estão agrupados nas quatro categorias básicas (maior,
menor, da dominante, e meio diminuto). Numa emergência, qualquer escala de
qualquer acorde de qualquer uma dessas categorias pode ser usada para qualquer
outro acorde naquela categoria. Há uma categoria adicional para acordes
diversos no final. Há muitas outras possíveis escalas e acordes. Entretanto,
essas são as mais importantes na harmonia tradicional do jazz.
Acorde Escala/Modo
Dó Maior,
Dó Lídio, Dó Maior Bebop
Cmaj7, Cmaj9, C6, C Dó Maior Pentatônica, Sol Maior Pentatônica
Cmaj7#11 Dó Lídio, Si in sen
Dó Dórico,
Dó Menor Bebop, Dó Menor Pentatônica
Cm7, Cm9, Cm11, Cm Fá Maior Pentatônica, Si Bemol Maior
Pentatônica
Mi Bemol
Maior Bebop, Dó Blues, Dó Menor
Dó Dórico,
Dó Menor Melódica, Dó Menor Pentatônica,
Cm6, Cm Fá Maior Pentatônica, Si Bemol
Maior Pentatônica,
Dó Menor
Bebop, Mi Bemol Maior Bebop, Ré in sen
Cm-maj7 Dó Menor Melódica, Dó Menor
Harmônica, Mi Bemol Maior Bebop
Cm7b6 Dó Menor, Lá Bemol Maior
Pentatônica
Cm7b9 Dó Frígio, Dó Frígio com Sexta
Maior
Dó
Mixolídio, Dó Lídio Dominante, Dó Bebop Dominante,
C7, C9, C13, C Dó Blues, Dó Maior Pentatônica
C7sus, Csus, C11 Dó Mixolídio
Bb/C, Gm7/C Dó Suspensa Pentatônica, Fá Maior
Pentatônica
C7#11, C7 Dó Lídio Dominante
C7alt, C7#9#5, C7#9 Dó Alterada, Fá Menor Harmônica, Fá Menor
Melódica
C7b9b5, C7b9 Dó Diminuta ST, Fá Menor Harmônica,
Fá Menor Melódica
C7aug, C7+, C7#5 Dó de Tons Inteiros
Cm7b5 Dó Lócrio com Segunda Maior,
Dó Lócrio
Cdim7 Dó Diminuta de Tons Inteiros
Dó Frígio,
Dó Frígio com Sexta Maior, Dó Frígio Espanhol
Cphryg Dó in sen
Cmaj7#5 Dó Lídia Aumentada, Dó Maior
Bebop
C7susb9 Dó Frígio com Sexta Maior, Dó
Frígio
Aplicando a Teoria à
Improvisação
A base das formas tradicionais de improvisação é
criar espontaneamente e tocar melodias que são construídas sobre a progressão
harmônica básica da canção. Nos níveis mais básicos, as notas que você escolhe
para sua improvisação são parcialmente ditadas pela escala associada com cada
acorde. Isso é chamado de improvisar sobre a progressão harmônica ("playing
changes"). Formas mais avançadas de improvisação dão ao músico mais
liberdade melódica e harmônica, seja pela redução do número de mudanças de
acordes, seja por tornar as progressões de acordes mais ambíguas em tonalidade,
a ponto de eliminar essas estruturas inteiramente. Essas abordagens são
discutidas separadamente abaixo.
Pianistas, guitarristas, e outros instrumentistas
que fazem seu próprio acompanhamento enquanto improvisam devem ler a seção
sobre acompanhamento junto
com essa seção, e tentar aplicar os dois conjuntos de conceitos ao mesmo tempo
quando estiverem improvisando.
Desenvolvimento Melódico
Uma de nossas principais preocupações deve ser
tocar melodicamente. Isso não necessariamente significa tocar bonitinho, mas é
preciso haver algum senso de continuidade para suas linhas melódicas, e elas
precisam ser interessantes em si mesmas. Você também precisa estar consciente
do desenvolvimento rítmico e harmônico de suas improvisações; eu incluo esses
conceitos na expressão "desenvolvimento melódico". Isso é difícil
ensinar, e é provavelmente o aspecto da improvisação que requer mais
criatividade. Qualquer um pode aprender as relações entre acordes e escalas; o
que você faz com esse conhecimento é o que determina como sua música vai soar.
O livro How To Improvise, de Hal Crook, tem muitas informações sobre o
desenvolvimento melódico, especialmente sobre variação rítmica, voltadas para o
músico de nível intermediário, enquanto The Lydian Chromatic Concept Of Tonal
Organization For Improvisation, de George Russell, e A Chromatic Approach To
Jazz Harmony And Melody, de David Liebman, contêm discussões avançadas e muito
técnicas sobre desenvolvimento harmônico.
Intensidade
Você precisa estar consciente do contorno de seu
solo. Uma maneira comum de estruturar um solo é baseada no modelo de como se
conta uma história. Você começa de maneira simples, vai acrescentando uma série
de tensões menores até um clímax, e aí chega a uma frase de desfecho. Isso
funciona bem na maioria das situações. No entanto, você pode querer
ocasionalmente variar desse formato. Você pode decidir começar com mais força
para abrir seu solo, ou pode querer encerrar bem no clímax, e deixar de lado o
arremate. Pode querer manter todo o solo com um baixo nível de intensidade para
passar uma sensação relaxada, embora você nem por isso vá querer entediar seus
ouvintes. Pode querer manter o nível de intensidade num ápice controlado. Mais
ou menos como um comediante trabalhando num auditório, você pode querer alterar
suas estratégias à medida que avalia o clima da plateia. Você deve se esforçar
para ter o controle da resposta emocional que sua música gera nos ouvintes.
Há alguns expedientes comuns que podem ser usados
para estruturar seu solo. Um dos mais importantes é a repetição. Depois que um
solista toca uma frase, ele frequentemente repete ela, ou uma variação dela.
Geralmente a frase, ou a variação, é tocada três vezes antes de se passar para
alguma outra coisa. A variação pode ser transportar a frase, ou alterar notas
importantes dentro dela para conformar a frase a um novo acorde/escala. A
variação pode consistir simplesmente de começar a frase num ponto diferente do
compasso, como no terceiro tempo em vez do segundo. A frase em si pode ser
alterada ritmicamente, tocando-se mais devagar ou mais rápido.
Relacionada à ideia da repetição, está a ideia de
pergunta e resposta. Em vez de repetir a frase original, você pode considerar a
frase como uma pergunta ou chamado, e continuar com uma resposta. Esta é a
analogia musical a perguntar "você foi à loja hoje?", e então
responder "sim, eu fui à loja hoje".
Na maioria dos instrumentos, você pode aumentar a
intensidade tocando com mais volume, mais alto, e mais rápido; tocar mais
suave, mais baixo, e mais lento geralmente reduz a intensidade. Tocar padrões
rítmicos simples, como semínimas e colcheias onde o acento cai no tempo, é
geralmente menos intenso do que tocar ritmos mais complexos, tais como ritmos
sincopados, onde a maioria dos acentos cai fora do tempo. Uma hemíola é um tipo
particular de esquema rítmico em que uma métrica é superimposta a outra. Um exemplo
disso é o uso de tercinas de semínimas quando se toca num compasso 4/4.
Uma nota longa sustentada consegue também gerar
intensidade na maioria dos instrumentos, embora os pianistas talvez precisem
usar trinados ou oitavas quebradas ("rolling octaves") para
alcançar esse tipo de sustentação. Uma única nota ou frase curta repetida
inúmeras vezes consegue produzir uma espécie similar de intensidade. Você
precisa usar seu próprio julgamento para decidir o quanto é o bastante.
Construção de Frases
As relações entre acordes e escalas não devem ser
vistas como sendo limitadoras ou determinantes de sua escolha de notas. Elas
são simplesmente um auxílio, uma maneira de ajudar você a relacionar ideias que
possa ter a dedilhados em seu instrumento. Suas ideias não devem, entretanto,
ser ditadas pelas escalas. Observe que muito poucos cantores de jazz usam
escalas extensivamente; eles geralmente conseguem traduzir uma ideia para suas
vozes mais diretamente. Por esse motivo, os instrumentistas devem praticar a improvisação
cantando, além de praticar seus instrumentos. Não importa o quanto sua voz
possa estar destreinada, ela é mais natural a você do que seu instrumento, por
isso você pode chegar à conclusão que consegue desenvolver ideias melhor
cantando-as em vez de tocando-as. Os cantores também são geralmente limitados
em sua capacidade de cantar ideias harmônicas complexas, entretanto, porque
eles não têm dedilhados bem praticados para os quais retornar. A teoria das
escalas pode ser de fato uma fonte de ideias; só assegure-se de que ela não é
sua única fonte.
Tente tocar linhas melódicas escalares que sejam
baseadas principalmente em graus conjuntos, linhas angulares que sejam baseadas
principalmente em saltos, bem como linhas que combinem as duas abordagens. Além
de se preocupar com a escolha das notas, tente variar o conteúdo rítmico de
suas ideias. Improvisadores iniciantes geralmente tocam inconscientemente quase
todas as suas frases com somente umas poucas bases rítmicas. Tente tocar linhas
que sejam baseadas principalmente em mínimas e semínimas, linhas que sejam
baseadas principalmente em colcheias e tercinas, bem como linhas que combinam
as duas abordagens.
Improvisando sobre a
Progressão Harmônica
Progressão Harmônica
Uma vez que você tenha alguma ideia da associação
entre as cifras dos acordes e as escalas, e como desenvolver uma linha
melódica, você pode começar a improvisar sobre progressões harmônicas. Em
situações de palco, a seção rítmica estará delineando as progressões harmônicas
no tempo, enquanto você toca linhas melódicas improvisadas baseadas nas escalas
que lhe são associadas. Geralmente haverá mudança de acorde a cada compasso, e
você precisa ficar trocando de escala para acompanhar. Entretanto, você não
deve pensar um acorde de cada vez. Você deve ficar tentando construir linhas
que levem de um acorde ao próximo.
A terça e a sétima de cada acorde são as notas que
mais definem o som do acorde. Se você enfatizar essas notas em sua
improvisação, vai ajudar a garantir que suas linhas melódicas vão implicar a
progressão harmônica com precisão. Por outro lado, se você enfatizar os outros
tons da escala, pode adicionar uma riqueza harmônica aos sons. Você também é
livre para usar notas que nem sequer estejam na escala. Músicos de bebop
geralmente usam uma técnica chamada "enclosure", em que uma
nota alvo é precedida por notas meio tom abaixo e acima, algo como uma
apojatura sucessiva. Isso é relacionado à ideia de uma nota sensível, exceto
que, no enclosure, o cromatismo é usado para enfatizar ou retardar uma nota
específica, em vez de para conectar duas outras notas. Outros tons de fora da
escala podem ser utilizados quando você achar interessante.
Embora haja muitas progressões harmônicas, há umas
poucas peças fundamentais que representam muitas das progressões que você verá.
Se você familiarizar-se com essas mudanças básicas, estará bem encaminhado para
conseguir tocar sobre qualquer conjunto de progressões que possa aparecer no
seu caminho. Os músicos devem praticar as progressões harmônicas descritas
abaixo em todos os doze tons para ganhar a maior fluência possível. Você pode
tentar alguns fraseados específicos nessas progressões, mas o mais importante é
que você deve simplesmente explorar muitas ideias diferentes sobre cada
progressão de modo que torne-se confortável improvisar verdadeiramente sobre
elas, em vez de simplesmente tocar fraseados prontos com os quais se sinta
confortável naquele tom. Você deve experimentar diferentes abordagens e
aprender como encaixar sua escolha de notas para um dado tipo de acorde numa determinada
situação para a sonoridade que você está tentando alcançar.
Além de ler sobre esses conceitos, você deve buscar
ouvir especificamente essas técnicas sendo aplicadas por outros músicos. Os
músicos de jazz mais populares dos anos 50 são um bom ponto de partida. Nomes
como Miles Davis, Clifford Brown, Sonny Rollins, John Coltrane, Cannonball
Adderly, Art Pepper, Red Garland, Hank Jones, Herb Ellis, Joe Pass, Paul
Chambers e Ray Brown. Qualquer álbum dessa época com um ou mais desses músicos
é recomendado para se aprender a respeito de improvisação sobre progressões de
acordes.
ii-V
A progressão de acordes mais importante do jazz é a
ii-V, que pode ou não resolver em I. A maioria das músicas tem progressões ii-V
em vários tons espalhadas por ela. Por exemplo, tomemos a seguinte progressão
de acordes:
| Cmaj7 | Dm7 G7 | Em7 | A7 | Dm7
| G7 | Cmaj7 |.
Há três progressões ii-V aqui. O compasso 2 forma um ii-V no tom de Dó, embora não haja o próprio acorde C (I) no compasso 3. Os compassos 3 a 5 formam um ii-V-I no tom Ré Menor, e os compassos 5 a 7 formam um ii-V-I em Dó novamente. Há muitos expedientes que podem ser usados quando se toca sobre progressões ii-V. Alguns deles estão descritos abaixo.
Tonalidade Maior
Numa tonalidade maior, a progressão ii-V-I consiste
de um acorde de sétima menor, um acorde de sétima da dominante, e um acorde de
sétima maior. As primeiras escolhas de escala que você aprendeu para esses
acordes são a dórica, a mixolídia, e a maior. No tom Dó, os acordes são Dm7 -
G7 - Cmaj7, e as escalas associadas serão então Ré Dórico, Sol Mixolídio, e Dó
Maior. Como pode ter notado, esses são todos modos da mesma escala Dó Maior.
Por isso quando você vê uma progressão ii-V numa tonalidade maior, pode tocar a
escala maior do acorde I em toda a progressão. Isso deixa um tanto mais fácil
construir linhas que conduzam de um acorde ao próximo, ou transcendam os
acordes individuais. Esse tipo de progressão, em que as escalas associadas com
cada um dos acordes são todas modos de um deles, é chamado de progressão
diatônica. Embora seja fácil tocar sobre progressões diatônicas, elas podem
rapidamente ficar maçantes, já que você está tocando as mesmas sete notas
durante um grande período de tempo. Você pode adicionar um pouco de variedade
usando uma das outras escalas associadas com cada acorde, como Ré Menor, Sol
Bebop Dominante e Dó Lídio.
A maneira mais comum de aumentar o interesse numa
progressão ii-V é alterar o acorde da dominante (V). Geralmente a alteração já
vai estar especificada para você, mas mesmo quando não estiver, você
geralmente, tem a liberdade de acrescentar alterações a acordes da dominante.
Ajuda se o solista e os acompanhantes estiverem tocando as mesmas alterações,
mas isso nem sempre é prático quando se improvisa, a menos que seu acompanhante
tenha ouvidos incríveis e consiga notar as alterações que você estiver fazendo,
e de qualquer maneira isso não é na verdade tão importante assim.
No tom de Dó, você pode substituir o acorde G7 por
um G7#11, um G7alt, um G7b9b5, ou um acorde G7+, os quais ainda preenchem a
função de dominante em Dó, mas implicam escalas diferentes. Por exemplo, se
você escolher G7#11, a progressão então vira Ré Dórico, Sol Lídio Dominante, Dó
Maior.
Outra alteração possível à dominante é chamada de
substituição pelo trítono. Isso significa substituir o acorde da dominante por
um acorde de sétima da dominante a um trítono de distância. No tom de Dó, isso
significa substituir o G7 por um Db7. Pode parecer estranho, mas há alguns
motivos muito bons pelos quais isso funciona. A terça e a sétima de um acorde
são as duas notas mais importantes na definição da sonoridade e da função de um
acorde. Se você olhar um acorde Db7, verá que ele contém Ré Bemol, Fá, Lá
Bemol, e Si, que são respectivamente b5, 7, b9, e a 3 de um acorde G7. A terça
e a sétima do acorde G7 (Si e Fá) tornam-se a sétima e a terça do acorde Db7.
Assim, o Db7 é muito similar a um acorde G7b9b5 em sonoridade e função. Além
disso, a resolução melódica de Ré Bemol para Dó no baixo é muito forte, funcionando
quase como um tom de passagem.
Uma vez que você tenha feito a substituição do
acorde, pode então tocar qualquer escala associada com o acorde Db7, resultando
por exemplo numa progressão de Ré Dórico, Ré Bemol Mixolídio, Dó Maior. Usar
uma outra escala que não a mixolídia vai gerar algumas coisas surpreendentes.
Tente uma escala Ré Bemol Lídia Dominante, que implica um acorde Db7#11 para a
dominante substituta. Parece ou soa familiar? É o que deve, porque as escalas
Ré Bemol Lídio Dominante e Sol Alterado são ambas modos da mesma escala Lá
Bemol Menor Melódica. Quando você toca linhas baseadas em Ré Bemol Lídio
Dominante, está tocando linhas que também são compatíveis com Sol Alterado. Por
outro lado, Ré Bemol Alterado e Sol Lídio Dominante são ambos modos da mesma
escala Ré Menor Melódica, e podem ser usadas indistintamente. Além disso, as
escalas diminutas semitom-tom de Ré Bemol e Sol são idênticas, do mesmo modo
que as respectivas escalas de tons inteiros. Esses são outros motivos pelos
quais a substituição pelo trítono funciona tão bem.
Tonalidade Menor
Progressões ii-V numa tonalidade menor geralmente
não sofrem do problema de soar muito diatônicas. Como a menor harmônica é
normalmente usada para gerar progressões de acordes na tonalidade menor, uma
progressão ii-V em Lá Menor pode consistir de | Bm7b5 E7 | Am-maj7 |. Se
tentarmos montar um acorde de nona a partir do E7, veremos que o Fá natural no
tom de Lá Menor Harmônico gera um acorde E7b9. Sem muita alteração especial,
essa progressão pode implicar uma Si Lócria, Mi diminuta ST, e Lá Menor
Melódica. Essas escalas são ricas o bastante para não precisar de alterações
adicionais.
Entretanto, a maioria das mesmas técnicas usadas na
tonalidade maior podem ser usadas numa tonalidade menor também. Podemos usar as
escalas menores melódica ou harmônica a partir do acorde i, ou a escala bebop
maior a partir de sua relativa maior, sobre toda a progressão. Podemos usar uma
variação diferente do acorde E7, como E7alt ou E7+, ou até mesmo E7sus; podemos
fazer uma substituição pelo trítono que vai gerar um Bb7; e assim por diante.
Podemos também substituir os acordes ii, por exemplo, usando a escala lócria
com segunda maior, ou substituir o Bm7b5 por um acorde Bm7 normal, em que o Fá
Sustenido vem do tom Lá Menor Melódico em vez do Lá Menor Harmônico. Se
fôssemos montar um acorde de nona, o Dó natural no tom Lá Menor Melódico
geraria um acorde Bm7b9, que implica uma escala Si Frígia. Podemos até trocar o
acorde Bm (ii) por um acorde B7 (II), especialmente um acorde B7alt, que contém
o Ré do acorde Bm. Podemos também alterar o acorde i, substituindo-o por um
acorde Am7 simples, e usar qualquer das várias possíveis escalas associadas com
esse acorde, como Lá Menor, Lá Frígia, Lá Menor Pentatônica, e assim por diante.
Blues
O termo "blues" é um tanto
sobrecarregado, descrevendo tanto um estilo geral de música e uma categoria
mais específica de progressões harmônicas, como também seu sentido coloquial de
um sentimento de tristeza ou melancolia, como na frase "I've got the
blues" (Estou triste). O blues como um estilo tem uma rica história que
está além do escopo desta Introdução. A forma básica de blues de 12 compassos
foi mencionada anteriormente. Em sua forma original, ainda tocada geralmente na
música rock e R&B, somente três acordes são usados: o acorde I, o acorde
IV, e o acorde V. A progressão básica do blues é a seguinte:
|| I | I | I |
I | que, || F
| F | F | F |
| IV | IV | I | I
| no tom de Fá, | Bb | Bb | F | F |
| V | IV | I
| I || gera: | C
| Bb | F | F ||.
Os acordes são geralmente tocados todos como
acordes de sétima da dominante, embora eles não estejam de fato funcionando
como acordes da dominante, já que eles não resolvem numa tônica. A escala de
blues em Fá pode ser tocada sobre toda essa progressão. Embora a progressão de
blues possa ser tocada em qualquer tom, os tons mais populares entre músicos de
jazz parecem ser Fá, Si Bemol, e Mi Bemol, enquanto músicos de rock geralmente
preferem Mi, Lá, Ré ou Sol. Isso tem muito a ver com a maneira como os
instrumentos são afinados. Os instrumentos mais usados no jazz, como o trompete
e os vários membros da família do saxofone, são geralmente afinados em Si Bemol
ou Mi Bemol, o que significa que um "Dó" na pauta, quando tocado
nesses instrumentos, soa na verdade como um Si Bemol ou um Mi Bemol,
respectivamente. A música escrita para esses instrumentos é portanto
transposta. As posições dos dedos nesses instrumentos favorecem tocar em Dó,
que é na verdade Si Bemol ou Mi Bemol, dependendo do instrumento. As guitarras
tendem a dominar a música rock, e as guitarras são afinadas para favorecer os
tons que contêm sustenidos.
Tocar a escala de blues sobre a progressão básica
de três acordes de blues num contexto de jazz envelhece muito rapidamente. A
partir da Era do Swing, e mais notavelmente na Era do Bebop, os músicos
começaram a adicionar elementos a essa fórmula simples. Uma adaptação comum da
progressão de blues, que ainda é considerada o padrão para sessões de improviso
de jazz ("jazz jam sessions"), é a seguinte:
|| F7 | Bb7 | F7
| F7 |
| Bb7 | Bb7
| F7 | D7alt |
| Gm7 | C7
| F7 | C7 |.
Essa progressão oferece uma gama maior de
possibilidades de escala do que a progressão básica de blues de três acordes.
Por exemplo, os compassos 8 e 9 formam um V-i em Sol menor, e os compassos 9 a
11 formam um ii-V-I em Fá.
A ideia de adicionar o ii-V à progressão de blues
resulta em mais variações. Tomemos por exemplo o seguinte:
|| F7 | Bb7 | F7
| Cm7 F7 |
| Bb7 | Bdim
| F7 | Am7b5 D7alt |
| Gm7 | C7alt
| F7 D7alt | Gm7 C7alt |.
Essa progressão em particular é especialmente comum
no bebop e nos estilos posteriores. Observe a substituição de um ii-V-I em Si
Bemol nos compassos 4 a 5, um ii-V-i em Sol Menor nos compassos 8 a 9, e um V-i
em Sol Menor nos compassos 11 a 12. Observe também o acorde diminuto no
compasso 6. Esse acorde diminuto está servindo como um substituto para o acorde
de sétima da dominante, já que tanto o Bdim quanto o Bb7b9 compartilham da
mesma escala Si Bemol Diminuta Semitom-Tom (Si Tom-Semitom). Essa mesma
substituição pode ser feita na segunda metade do compasso 2.
Outras variações podem ser feitas usando
substituições pelo trítono. Por exemplo, Ab7 pode ser tocado no lugar do D7alt
na segunda metade do compasso 8. Você pode também mudar a qualidade dos
acordes, substituindo por exemplo esse Ab7 por um Abm7. Outra substituição
comum é um A7alt no lugar do F7 no compasso 11. Essa substituição funciona
porque os acordes compartilham várias notas, entre elas a tônica, Fá, e porque
o A7alt forma parte de uma progressão II-V-i em Sol Menor com o D7alt e o Gm7 que
vêm em seguida.
Charlie Parker levou esses tipos de substituições a
um extremo em "Blues For Alice". A progressão harmônica dessa música
é a seguinte:
|| Fmaj7 | Em7b5 A7b9 | Dm7 G7
| Cm7 F7 |
| Bb7 | Bbm7
Eb7 | Am7 D7
| Abm7 Db7 |
| Gm7 | C7
| Fmaj7 D7alt | Gm7 C7 |.
Essa progressão usa a maioria das técnicas
descritas acima. Pode ser uma boa você se dedicar a tocar com essa progressão
por um tempo.
Progressão I Got Rhythm
A música "I Got Rhythm", de George
Gershwin, é a fonte de uma das progressões harmônicas mais populares da era do
bebop, perdendo somente para a progressão de blues. Essa forma é chamada pelos
músicos de jazz simplesmente de progressão Rhythm (em inglês,
"Rhythm changes"). Como acontece com a progressão de blues, há
muitas possíveis variações sobre a progressão Rhythm. A maioria das músicas
baseadas na progressão Rhythm é tocada no tom Si Bemol, e em andamentos muito
rápidos, geralmente bem acima de 200 batimentos por minuto. Essas músicas têm
uma forma AABA de 32 compassos baseada na seguinte progressão de acordes:
A || Bbmaj7 G7 | Cm7 F7 |
Bbmaj7 G7 | Cm7 F7 |
| Fm7 Bb7 | Ebmaj7 Ab7 | Dm7 G7 | Cm7
F7 ||
A || Bbmaj7 G7 | Cm7 F7 |
Bbmaj7 G7 | Cm7 F7 |
| Fm7 Bb7 | Ebmaj7 Ab7 | Cm7 F7 | Bbmaj7 ||
B || Am7 | D7 | Dm7 | G7 |
| Gm7 | C7 | Cm7 | F7 ||
A || Bbmaj7 G7 | Cm7 F7 |
Bbmaj7 G7 | Cm7 F7 |
| Fm7 Bb7 | Ebmaj7 Ab7 | Cm7 F7 | Bbmaj7 ||
Essa progressão contém muitas progressões ii-V.
Qualquer uma das alterações comuns descritas no trecho sobre progressões ii-V
acima podem ser usadas quando se está tocando sobre uma progressão Rhythm.
Muitas músicas contêm ligeiras alterações dessa progressão básica,
especialmente nos últimos quatro compassos das seções A. Algumas das alterações
comuns são substituir o segundo acorde G7 por um acorde diminuto Bdim, ou
substituir o quinto acorde Bbmaj7 pelo Dm7. A primeira substituição já foi
descrita quando falamos da escala diminuta. A segunda troca um acorde I por um
acorde iii, que têm três das quatro notas em comum, e cujas respectivas escalas
diferem somente em uma nota. Além disso, o Dm7 e o G7 que o seguem formam um
ii-V em Dó Menor, por isso essa é uma substituição especialmente forte
harmonicamente.
As características importantes da progressão Rhythm
são as repetidas sequências I-VI-ii-V (ou substitutos) nos primeiros quatro
compassos das seções A, e os movimentos básicos da tonalidade em quintas na
ponte, conduzindo de volta à tônica original da última seção A. Se você quer
virar um músico improvisador, deve ficar fluente na progressão Rhythm básica,
especialmente no tom Si Bemol, e ficar familiar com as variações particulares
associadas com músicas específicas. Essa também é uma boa oportunidade de
testar o que você aprendeu sobre o ii-V, e de praticar tocar em andamentos
rápidos.
Progressão Coltrane
John Coltrane, por meio de composições originais
como "Giant Steps" e "Countdown", do álbum Giant Steps, e
arranjos de standards como "But Not For Me" no álbum My Favorite
Things, ficou conhecido por usar uma progressão particularmente complexa que é
geralmente chamada de progressão Coltrane, embora ele não tenha
sido o primeiro ou único músico a fazer uso delas.
A característica básica da progressão Coltrane é o
movimento de tonalidade por terças maiores. A progressão de "Giant
Steps" é a seguinte:
|| Bmaj7 D7 | Gmaj7
Bb7 | Ebmaj7 | Am7 D7 |
| Gmaj7 Bb7 | Ebmaj7 F#7 | Bmaj7 | Fm7
Bb7 |
| Ebmaj7 | Am7
D7 | Gmaj7 | C#m7
F#7 |
| Bmaj7 | Fm7
Bb7 | Ebmaj7 | C#m7 F#7 ||
O primeiro centro tonal aqui é o Si, depois Sol, em
seguida Mi Bemol, e ele continua a mover-se em ciclo por essas três tonalidades,
que estão a uma terça maior de distância.
Coltrane conseguiu desenvolver essa ideia de várias
maneiras. Por exemplo, ele a usou como um substituto para uma progressão ii-V
normal. A progressão de "Countdown" é baseada por alto na progressão
da composição de Miles Davis chamada "Tune-up". Essa música começa
com a seguinte progressão de quatro compassos:
| Em7 | A7 | Dmaj7 | Dmaj7 |,
que é uma manjada progressão ii-V-I em Ré Maior. Os
primeiro quatro compassos de "Countdown" são:
| Em7 F7 | Bbmaj7 Db7 | Gbmaj7 A7 | Dmaj7 |.
Coltrane começa com o mesmo acorde ii, e depois
modula para o acorde de sétima da dominante meio-tom acima. A partir daí, ele
inicia o ciclo de terças maiores, passando do tom Si Bemol para Sol Bemol e
voltando finalmente a Ré. Os quatro compassos seguintes da música são idênticos
harmonicamente, exceto que estão baseados num ii-V em Dó; os quatro compassos
seguintes são a mesma coisa em Si Bemol.
Solar sobre uma progressão Coltrane pode ser um
desafio, já que o centro tonal aparente muda tanto. Não dá para simplesmente
tocar uma única escala diatônica sobre vários compassos. As músicas geralmente
são tocadas em andamentos rápidos, e também é fácil cair na armadilha de não se
tocar nada além de arpejos que delineiem os acordes. Você precisa tentar ficar
bastante atento e se lembrar de tocar melodicamente quando estiver solando
sobre uma progressão tão complexa como é a progressão Coltrane.
Improvisação Modal
Uma típica música modal pode ter somente dois ou
três acordes, e cada um deles pode durar por 8 ou até 16 compassos. Num certo
sentido, tocar música modal é muito mais fácil do que improvisar sobre
progressões harmônicas, já que não exige que seu cérebro faça tantos cálculos
rápidos para mudar constantemente de escalas. Num outro sentido, entretanto,
ele impõe mais desafios, já que você não pode simplesmente jogar lá uns
fraseados de ii-V que praticou, nem contar com o uso inteligente de escalas e
substituição de acordes para encobrir problemas básicos do pensamento melódico
durante o improviso.
Algumas músicas são com frequência consideradas
modais, apesar de seguir progressões de acordes tradicionais como as do blues.
O conceito de modalidade tem tanto a ver com o que é feito com a harmonia
quanto com seu ritmo de mudança. Nos estilos derivados do bebop, um solista
pode manter a atenção dos ouvintes por sua escolha de notas sobre a harmonia,
inclusive dissonâncias, tensões, e liberações. Por exemplo, músicos de bebop
gostavam muito de encerrar frases com a quarta elevada sobre um acorde de
sétima da dominante, só pelo efeito que aquela nota tinha. Quando se sola sobre
música modal, há menos ênfase nas escolhas harmônicas, e mais no
desenvolvimento melódico. A balada "Blue In Green" do disco Kind Of
Blue de Miles Davis tem tanto movimento harmônico quanto muitas outras músicas,
e seus acordes são acordes relativamente complexos, como o Bbmaj7#11 ou o
A7alt. E entretanto os solos nessa faixa não exploram a harmonia; em vez disso,
eles se concentram no interesse melódico de frases individuais. Os
improvisadores do bebop podem enfatizar as extensões dos acordes em seus solos,
enquanto os improvisadores modais tendem a enfatizar as notas básicas dos
acordes. Os músicos do bebop são geralmente mais inclinados a preencher todos
os espaços com notas para definir completamente a harmonia, enquanto os músicos
modais são mais propensos a usar o espaço rítmico como um elemento estruturador
melódico. As duas abordagens são válidas, mas é importante compreender as
diferenças entre elas.
A música "So What" de Miles Davis, no
álbum Kind Of Blue, é o exemplo clássico de uma música modal. Ela segue uma
estrutura básica AABA, em que a seção A consiste do modo Ré Dórico, e a seção B
consiste do modo Mi Bemol Dórico. Isso resulta em 16 compassos consecutivos de
Ré Dórico no começo de cada chorus, 24 se contados os últimos 8 compassos do
chorus anterior. Você pode rapidamente começar a ficar sem ideias se você se
limitar a somente as sete notas da escala Ré Dórica, mas esse é o desafio. Você
não pode contar com a sonoridade geralmente bem-aceita de um Fá Sustenido sobre
um acorde C7; você precisa tocar melodicamente com as notas que lhe são dadas.
Você não está, entretanto, completamente limitado
às notas da escala. Do mesmo modo que acontece com as progressões ii-V, há
alguns expedientes que você pode usar num contexto modal para adicionar tensão.
Um dos mais populares desses esquemas é chamado "sideslipping".
Sobre um fundo de Ré Dórico, tente tocar linhas baseadas nas escalas Ré Bemol
ou Mi Bemol por um compasso ou dois. Essa dissonância cria uma tensão, que você
pode liberar ao voltar para a escala original. Você também pode usar notas de
passagem cromáticas. Por exemplo, sobre uma escala Ré Dórica, você pode tentar
tocar "Sol, Sol Sustenido, Lá", em que o Sol Sustenido é uma nota de
passagem.
Você também pode variar a escala usada. Por
exemplo, em vez da Ré Dórica, tente uma Ré Menor Natural, ou uma Ré Menor
Pentatônica, em uns poucos compassos. Você pode alternar um acorde de tônica
com um acorde de sétima da dominante nessa tonalidade. Por exemplo, o acorde
associado com Ré Dórico é o Dm7. Se você tratar ele como um acorde i, o acorde
V7 passa a ser o A7. Então você pode usar linhas de quaisquer das escalas
associadas com A7, A7b9b5, A7alt, ou outros acordes de sétima da dominante de
Lá, em momentos de sua improvisação. Isso vai criar um tipo de tensão que você
pode resolver ao retornar à escala original de Ré Dórico.
Na maioria das vezes, contudo, você deve tentar
apegar-se à filosofia modal quando estiver tocando músicas modais, e
concentrar-se em ser tão melódico quanto possível com o acorde e as notas do
acorde básicos. Escalas pentatônicas são uma escolha especialmente apropriadas
para se tocar música modal, já que elas estreitam sua escolha para somente
cinco em vez de sete notas, forçam você ainda mais a pensar em usar espaço e
tocar melodicamente. Um som similar é obtido quando se tocam linhas montadas a
partir do intervalo de quarta. Isso é chamado harmonia quartal. Ela é particularmente
eficiente em músicas modais com poucas mudanças de acordes, embora esse tipo de
linha possa ser usado também em outras situações.
Cromatismo
Os estilos do bebop foram caracterizados
anteriormente como explorando as harmonias pela escolha de escalas com muitas
cores tonais, enquanto o estilo modal foi caracterizado como enfatizando as
notas básicas dos acordes. Essas duas abordagens ainda usam, até certo ponto,
relações acorde/escala na maneira tradicional de escolher uma escala que
implica o som do acorde, e tocar principalmente dentro daquela escala. Uma
outra abordagem é manter a noção de progressões de acordes, mas tocar linhas
que ficam em grande parte fora das escalas associadas. Isso é às vezes chamado
de cromatismo. Eric Dolphy usou essa abordagem enquanto tocava com Charles
Mingus e em alguns de seus próprios álbuns, como Live At The Five Spot e Last
Date. Woody Shaw e Steve Coleman também são músicos cromáticos.
A esta altura, você provavelmente já tocou algumas
notas de fora da escala, digamos um Lá Bemol contra um acorde Cmaj7,
possivelmente por acidente. Essas notas podem soar erradas quando tocadas no
contexto de uma melodia que de outro modo caminha dentro da escala. Ao tocar
uma melodia derivada de uma escala, você estabelece uma sonoridade específica,
e uma nota errada soará estranha. Entretanto, quando se toca uma melodia que
fica em sua maior parte fora da escala, as mesmas notas podem se encaixar muito
mais logicamente. Isso significa dizer que notas de fora da escala usadas
melodicamente podem com frequência soar consonantes (o oposto de dissonante).
Os músicos citados acima geralmente tocam linhas
melódicas muito angulares, ou seja, com intervalos grandes ou incomuns, e mudam
de direção com frequência, em vez de tocar basicamente se limitando a
intervalos menores dentro de uma escala. Isso geralmente parece estabelecer uma
sonoridade em que notas erradas soam perfeitamente naturais. É interessante
notar que a abordagem oposta funciona também: linhas que contêm muitos
meios-tons geralmente soam corretas, apesar de consistir de muitas notas
erradas. Essas linhas são às vezes chamadas de cromáticas.
Você pode continuar a usar seu conhecimento das
relações acorde/escala quando estiver tocando cromaticamente. Por exemplo, você
sabe que uma escala Ré Bemol Lídia não é normalmente uma escolha apropriada
para se tocar sobre um acorde Cmaj7, e você provavelmente tem uma ideia de por
quê. Essas mesmas notas erradas, entretanto, se usadas melodicamente sobre o
acorde, criam uma sonoridade que não é tão dissonante assim e têm uma riqueza
harmônica que soa muito moderna. Aliás, até ideias melódicas simples, como
arpejos e escalas, podem soar complexas neste contexto.
Você pode praticar essas ideias com álbuns do Jamey
Aebersold, ou com o Band-In-A-Box, ou com seus colegas músicos, embora deva
estar preparado para alguns olhares estranhos. Já se disse que não existem
notas erradas, somente resoluções erradas. Isso certamente explica por que
notas de passagem e enclosures soam consonantes, mas eu sinto
que essa frase ainda dá um valor alto demais a tocar as notas sugeridas pelas
relações tradicionais de acorde/escala. Eu diria isso de outra maneira; as
únicas notas erradas são as notas que você não teve a intenção de tocar.
Qualquer nota que você toque pode ser correta se estiver num contexto que faça
sentido e não soe como um acidente. Até cometer erros tem seu valor. O segredo
está em formar um todo coerente.
Improvisação Atonal
As expressões pantonal, não tonal e atonal
descrevem o obscurecimento ou a eliminação da tonalidade tradicional. A
distinção entre esses termos nem sempre é clara, por isso vou usar
"atonal" para descrever a música que não tem um centro tonal
específico, ou sobre a qual as relações de acorde/escala nem sempre se aplicam.
Embora a música atonal possa aparentar ter
progressões de acordes, os acordes individuais são geralmente escolhidos por
causa de sua sonoridade como um todo, em vez de por suas resoluções. Qualquer
acorde de qualquer tonalidade tem chance de ser usado se tiver a sonoridade
correta. Por exemplo, muitas das músicas nos álbuns E.S.P., Nefertiti, Miles
Smiles e Sorcerer, de Miles Davis, não têm centros tonais específicos, nem
contêm muitos ii-Vs tradicionais que indicariam centros tonais temporários.
Muitos dos acordes são relativamente complexos, por exemplo o Abmaj7#5, e cada
acorde é escolhido por sua sonoridade individual, não porque o acorde anterior
resolva nele naturalmente ou porque ele resolva no próximo acorde. Uma análise
funcional tradicional da harmonia (ou seja, a análise dos acordes em termos de
suas relações com a tonalidade), nem sempre é a melhor maneira de abordar esse
tipo de música.
Talvez seja uma boa tratar essa música modalmente,
e deixar que os próprios acordes ditem a escolha de escalas. Mas você deve ter
cuidado ao fazer isso. Muitas das relações tradicionais acorde/escala foram
criadas com resoluções tradicionais em mente. Uma frase pode soar aleatória e
desconexa se você cegamente mudar as escalas de acordo com a progressão
harmônica na música atonal. Você deve estar preparado para tratar as relações
acorde/escala mais relaxadamente do que faria se estivesse simplesmente
improvisando sobre uma progressão de acordes.
Na música tonal, as alterações de um acorde são
geralmente consideradas meramente notas de colorido que não afetam a função
básica de um acorde, e os improvisadores são livres para fazer suas próprias
alterações ao acorde básico. Por exemplo, um acorde G7b9 tende a ser um acorde
de sétima da dominante, que se resolve em Cmaj7. Qualquer outro acorde que
sirva essa função, como o G7#11, ou até mesmo uma substituição pelo trítono
como um Db7, pode ser usado no lugar sem mudar radicalmente como a frase é
percebida, por isso improvisadores tonais com frequência fazem esse tipo de
alteração à vontade, seja explicitamente, seja implicitamente por sua escolha
de escalas. Na música atonal, entretanto, um acorde é geralmente pedido
especificamente por causa de sua sonoridade única, e não por causa da função
dele numa progressão. O mesmo acorde G7b9 pode ter sido escolhido por causa da
dissonância específica do Sol contra o Lá Bemol, ou porque aconteceu de ele ser
a maneira mais conveniente de cifrar a abertura do acorde que o compositor
queria (uma abertura é simplesmente uma maneira de determinar as notas
específicas a serem tocadas num dado acorde). Mudar esse acorde para G7#11 pode
mudar o som do acorde mais radicalmente do que substituí-lo por um acorde que
de outro modo não seja relacionado, mas que tenha a mesma dissonância Sol/Lá
Bemol, como um Abmaj7, ou um que possa ter uma abertura similar, como o E7#9.
Você pode ver que as escolhas de escalas associadas com esses acordes são
substituições mais apropriadas do que aquelas baseadas na função tradicional de
acorde da dominante do G7b9.
A verdadeira intenção da música atonal, entretanto,
é liberar você das minúcias das relações acorde/escala e permitir que você se
concentre nas sonoridades em si. As linhas que você toca não precisam ser
analisadas em termos da relação delas com os acordes grafados, mas podem em vez
disso ser pensadas em termos de como eles se encaixam na sonoridade da frase
naquele ponto. Se o acorde num determinado compasso for um acorde maj7#5, é
preciso então ouvir a sonoridade desse acorde, e ficar à vontade para tocar
qualquer linha que implique essa sonoridade. Essa é uma implicação tanto
emocional quanto racional. Para mim, esse acorde em particular tem uma
sonoridade aberta, questionadora, que eu associo com intervalos abertos e com o
uso de espaço rítmico. Eu provavelmente tenderia a tocar linhas melódicas que
refletissem essa sensação, independente das notas específicas envolvidas. Além
disso, a sonoridade desse acorde pode também ser afetada por seu contexto na
peça em si. Por exemplo, um acorde tocado por dois compassos numa balada pode
soar completamente diferente do mesmo acorde usado como um acento numa peça de
andamento acelerado. Relações acorde/escala mesmo assim podem ajudar a definir
que notas tendem a ser mais ou menos dissonantes contra um determinado acorde, mas
você deve tentar organizar seu pensamento em torno de linhas de sons, e usar as
relações acorde/escala somente como ferramentas para ajudar você a alcançar as
sonoridades desejadas.
Mesmo na música tonal, é claro, as relações
acorde/escala podem ser consideradas como ferramentas, e alguém pode dizer que
a meta é sempre representar sonoridades. Entretanto, você pode ver que músicas
com muitos ii-Vs nelas tendem a "soar" a mesma coisa nesse aspecto. A
música atonal foi criada para fornecer uma paleta mais variada de sons, para
encorajar o ato de pensar em torno dessas linhas. Do mesmo modo como acontece
com o cromatismo e a música tonal, dá para tocar deliberadamente linhas que
contradizem a sonoridade de um acorde, se esse for o efeito desejado. O importante
é que você perceba uma progressão de acordes atonal como uma receita de
sonoridades sobre as quais você improvisa, e não como um esquema específico de
resoluções de acordes.
Improvisação Livre
O próximo nível de liberdade em improvisação é
eliminar os acordes totalmente. Dependendo de até que ponto você esteja
disposto a ir, você também pode dispensar a melodia, ritmo, timbre ou forma
tradicionais. Há muitas abordagens diferentes para se tocar livremente, mas por
sua própria natureza, não há regras. Em vez de detalhes técnicos, em boa parte
o que vamos usar são exemplos de outros músicos.
Muitas das composições de Ornette Coleman não têm
nenhum acorde. A maioria das gravações do quarteto freebopdele com
Don Cherry para o selo Atlantic caem nessa categoria. O tema (head)
consiste de uma melodia somente, e os solos são variações sobre a melodia ou
sobre a percepção da música em geral, e não sobre qualquer progressão de
acordes. Em sua maior parte, essas gravações ainda mostram uma abordagem muito
melódica e são acessíveis a muitos ouvintes. Uma linha do baixo e uma marcação
4/4 com suingue na bateria são uma constante em toda a música, e a forma é a
forma standard de tema-solos-tema.
O álbum Free Jazz, do Ornette Coleman, que
apresenta um quarteto duplo que inclui Eric Dolphy e Freddie Hubbard, é
decididamente diferente. Aqui Ornette está não somente colocando de lado
conceitos tradicionais de harmonia, mas também de melodia. Não há tema definido
para a faixa única que compreende esse álbum, e as improvisações são menos
melódicas do que nos álbuns com quarteto. O quarteto duplo também faz
experiência com a forma nesse álbum, geralmente tendo vários improvisadores
tocando ao mesmo tempo. Essa ideia é tão antiga quanto o próprio jazz, mas foi
praticamente esquecida com o advento da Era do Swing. A ideia dos músicos da
improvisação livre de uma improvisação coletiva é muito menos estruturada do
que a dos músicos do Dixieland, e os resultados são mais cacofônicos.
John Coltrane fez incursões similares no fim de sua
carreira, em álbuns como Ascension. Coltrane também fez experiências com ritmo,
especialmente em álbuns como Interstellar Space, que não apresenta nenhuma
pulsação definida. Tanto Coleman quanto Coltrane, bem como músicos
influenciados por eles, como Archie Shepp e Albert Ayler, também fizeram
experiências com timbre, descobrindo novas maneiras de extrair sons de seus
instrumentos, até mesmo ao ponto de tocar instrumentos em que tinham pouca ou
nenhuma formação, como Ornette fez com o trompete e o violino.
Cecil Taylor toca o piano de uma maneira
completamente livre, utilizando ele tanto com o um instrumento de percussão,
quanto um instrumento melódico ou harmônico. Suas apresentações geralmente não
contêm nenhum elemento estruturador tradicional de harmonia, melodia ou ritmo.
Ele cria suas próprias estruturas. Quando você toca música livre numa
apresentação solo, você tem completa liberdade para mudar as direções da música
a qualquer momento, e você responde somente a você mesmo. Você pode mudar o
andamento, pode tocar sem andamento, pode variar a intensidade de sua
apresentação do jeito que achar melhor. Quando você toca música sem forma
estabelecida numa configuração de grupo, a comunicação se torna especialmente
importante, porque não há uma moldura automática de referência para manter
todos juntos. Cecil Taylor também toca em grupo, e outros grupos como o Art
Ensemble Of Chicago são conhecidos por esse tipo de liberdade.
É difícil analisar esses estilos de música nos
termos que estamos acostumados a usar. A música precisa nos alcançar num nível
emocional para cumprir sua missão, e as emoções de cada pessoa podem ser
afetadas diferentemente. Geralmente parece ser o caso de que quanto mais livre
a música, mais intensamente pessoal é a mensagem. Você precisa decidir por si
próprio até que ponto está disposto a ir em sua própria prática musical, bem
como em sua própria prática como ouvinte. Você deve também estar ciente de que,
para muitas pessoas, esse tipo de música é geralmente mais legal tocar do que
ouvir. O desafio da comunicação e a excitação da livre troca de ideias são
coisas que alguns ouvintes não são capazes de apreciar. Essa é uma maneira
gentil de dizer que a sua experimentação pode alienar parte de seu público
original. Entretanto, há públicos que apreciam esse tipo de música. Não se
sinta desencorajado a tocar tão livremente quanto desejar.
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